Mostrar mensagens com a etiqueta alfama. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta alfama. Mostrar todas as mensagens

domingo, setembro 22, 2013

Caixa Alfama 2013


Este ano não fui ao Super Bock, ao Sudoeste, nem sequer ao Optimus Alive. Mas fui ao Festival de Fado. Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades. Troquei as esperas de horas sentados no chão à espera do início do primeiro concerto para guardar bons lugares à frente, por uma cadeira a uma distância que não me permitia ver as caretas da Gisela João. 
De costas para o rio e para a lua quase cheia,  de frente para uma Alfama iluminada, um pouco mais inundada do que o normal pelos trinados de guitarras, a noite começou com a Gisela, por quem me apaixonei à primeira  vez que ouvi uma música dela. Não conhecendo mais nada do seu repertório, sorvi o concerto com a alegria de quem ouve música boa pela primeira vez. Depois, já sem a responsabilidade de uma estreante, a Ana Moura, encheu a plateia com a sua elegância e a voz grave de quem já alcançou e sedimentou o seu lugar na música deste nosso país. Não cantou o "Fado da Procura" nem o "Até o Verão", mas eu cantei-as à mesma na minha cabeça. Dispensei o Camané e esperei pela noite de Sábado. Numa noite já não tão quente, a bairrista Raquel Tavares abriu as hostilidades com o sangue na guelra de quem vive (em) Alfama. Dedicou uma música às pessoas de Alfama e eu demorei alguns segundos a perceber que aquela também seria para mim! Cuca Roseta foi uma agradável surpresa, já que não a conhecia. Terminado o seu concerto, corri com a Sofisabel para as filas da frente à espera do Zambujo e a sua lambreta. "Algo estranho acontece" quando aquele homem começa a cantar. A sua voz inebria sem entediar, encanta, embala-nos, põe-nos com um sorriso bobo na cara. Uma delícia.

E mais uma vez, senti uma comichãozinha boa na barriga por viver nesta cidade e nestes bairros antigos, por sentir-me parte das 1001 histórias que eles têm para contar e por me saber fadista, à minha própria maneira.

domingo, outubro 05, 2008

"Esta foi a história que eu escolhi..."


Percorro calçadas antigas, vibrantes, brilhantes, tentando imaginar as mil e umas histórias que certamente guardam. Imóveis, estáticas e com tanta vida a latejar, como se quisessem percorrer mundo, espalhando o seu aos sete ventos. Guardam no entanto segredos, sei que o fazem, apenas isso. E talvez seja esse o seu encanto.

Fragmento-me nas pedras da calçada, nos azulejos azuis e brancos que cobrem as fachadas de edifícios degradados por fora, incandescentes por dentro.

As flores nas janelas e a roupa a secar lembram-me uma cidade que julgava perdida nos fados de uma Amália Rodrigues que rejubila em todo o seu esplender de glória imortal. Sou personagem dos seus fados, misturado com um Pessoa que tem "todos os sonhos do mundo", vivendo no seu próprio e único universo. Debruça-se aquele tão nobre e antigo sentimento português, uma tal de "saudade" que saboreio, nunca julgando que a sua presença pudesse ser tão deliciosa, tão aconchegante, tão necessária. É saudade e não o é.

Desejo uma varanda com vista para o Tejo, aquela que me fará sentir em casa quando receber os primeiros raios de sol num frio dia de Inverno, enquanto ouço poemas escritos num bloco de rascunho por mãos calejadas. São assim que as imagino quando penso nos mais felizes poetas que alguma vez li. E escrevem-nos com alma de pássaro, paciência de pintor e habilidade de guitarrista. E sabedoria das pedras da calçada que sobem, descem, conhecem e vivem cada dia, cada noite. Cada beco, cada ruela. Cada verso dos fadistas, cada risode criança que viram crescer.

Encontrei-me nestas ruas perdidas e com tanto para contar.


Aguarela de Catherine Labey (2007)