sábado, outubro 08, 2011

Índios da Meia-Praia (e da Bela Vista)


Que eu já estou habituado a meter-me em tudo o que são "cenas", já se sabe. Mas quando se trata de repetir "cenas" que não tenham corrido bem anteriormente pode parecer parvoíce. Mas em tempo de crise não se rejeitam oportunidades de trabalho, vai daí, voltei à escola. O "probleminha" não está propriamente no voltar para a escola, mas sim em ir para uma num Bairro Social de Lisboa com crianças que no primeiro dia conseguiram proferir mais palavrões em 45 minutos do que eu na minha vida toda, e quem me conhece sabe bem que tenho de lavar a boca todas as (poucas) vezes que digo "Cocó", hunf! São pequenos índios que mandam no pedaço, felizmente ainda não se lembraram de trazer as flechas, até agora ficaram-se pelas pedras. Na minha altura, quando eu era um ser aborrecido de 1,4 metros, brincávamos aos tazos, agora brinca-se aos apedrejamentos, deve ser alguma coisa que viram na televisão. Podia ter-lhes dado para os vampirismos, mas isso é tão 2009 e há-que acompanhar as tendências. Nunca as profissões de Professor ou Pastor estiveram tão próximas, passo a vida a contar cabeças e falta sempre alguma ovelha a faltar. E é encontrá-las espalhadas pela escola, umas a descer escorregas, outras a apanhar lagartas das couves, outras simplesmente a passear pelo bonito espaço que é a Escola e quem sabe, assistir a algum tiroteio das redondezas, como me vieram alguns alunos contar um dia destes durante um intervalo. 


O menino não quer fazer a aula, tudo bem. 


O menino quer partilhar com o mundo os palavrões que aprendeu, mesmo que não saiba contar até 10, tudo bem. 


O menino quer decidir as regras do jogo, tudo bem. 


Desde que ao final do dia eu chegue a casa com os orgãos todos no sítio e sem tiros dentro de mim, "tá-se bem"! Aos poucos começo a domar algumas criaturas, mas subitamente, sou mais psicólogo do que professor, não foi para isso que estudei, mas sempre tive um Eduardo Sá dentro de mim e felizmente ele está a querer sair. Tal como os sonhos que me vão atormentando à noite. Hoje voltei a sonhar com a escola quando eu só queria era sonhar com o Rio de Janeiro, Praga, as Ilhas Gregas, Tailândia ou Paris. Quanta injustiça! 




 Foto:© Lindsay Hebberd/CORBIS

5 comentários:

Martinho Mendes disse...

Pois é, desencontros da profissão e da vida. Gostei da crónica, apesar da tristeza inerente, é um texto bem humorado. Não distas da utopia, ela rege-nos a vida ;) hugs

GotchyaYinYang disse...

Boa sorte!!! :)

Anónimo disse...

É assim...fazer o quê?
Não leves a motinha prá zona... just in case...

dnesa

Pedro Espírito Santo disse...

Martinho, ao tempo que não te via por aqui! Não é tristeza, a coisa até tem resultado relativamente bem e ainda não fui apunhalado, mas acho que tenho uma família cigana prestes a querer fazê-lo. Pelo menos a miúda, a ver se não espalha muito pelo bairro! Não é o trabalho de sonho mas até é divertido de tempos a tempos.

Em relação à mota, só a levei 2 vezes e, se não irritar nenhum pai dos miúdos, irá escapar ilesa.

laury disse...

Gostei "mointo" disto. Não do facto de coreres perigo de vida mas de as tuas palavras terem saído sem qualquer esforço.